Destilado mais consumido no País, a pinga surgiu há cinco séculos e hoje movimenta um mercado bilionário
Por Guilherme Moraes
Pinga, cana, branquinha, “água que passarinho não bebe”, “marvada” e por aí vai. A quantidade de nomes pelos quais a cachaça é conhecida é tão grande quanto sua história, que remonta aos primeiros anos da colonização portuguesa no Brasil. Passados cinco séculos, hoje ela é a segunda bebida alcoólica mais consumida no País, atrás apenas da cerveja, e conta com milhares de produtores no País. Seu processo de fabricação é simples, mas exige muitos cuidados.
1 – Colhendo a matéria-prima
O processo de produção não difere da maioria dos destilados, passando por fermentação, destilação e eventualmente envelhecimento. Mas, primeiro, é preciso colher sua matéria-prima: a cana-de-açúcar. Tudo começa com o cultivo, por um ano, da cana-de-açúcar. O corte normalmente é manual, já que a planta não pode ser queimada ou vir com muitas folhas, como acontece na colheita mecanizada.
2 – Moagem
O segundo passo é a moagem da cana, que extrai da matéria-prima um suco fresco, de cor amarelo-esverdeada, conhecido em algumas regiões do Brasil como garapa. É esse suco que diferencia a cachaça de outros destilados da cana-de-açúcar que, como o rum, são feitos a partir do melaço. “Nessa etapa, é importante filtrar o caldo da cana para retirar os bagaços e outras impurezas. Também é preciso controlar a quantidade de açúcar acrescentando água, porque se o caldo estiver muito doce a levedura não se desenvolve”, explica Alexandre Bertin, dono da Cachaça Sapucaia, fundada em 1933 na cidade de Pindamonhagaba, no interior de São Paulo.
3 – Fermentação
O passo seguinte é a fermentação. O caldo extraído da cana é levado para descansar e passa pelo processo de fermentação natural, com a ação de leveduras. Esse processo dura, em média, de 24 a 36 horas, mas pode ser acelerado com catalisadores.
4 – Destilação
Por fim, o líquido é destilado, sendo que há duas formas de se fazer isso. Com a produção artesanal, a cachaça é destilada em um alambique, uma espécie de panela de pressão gigante. No método industrial de produção da cachaça, são utilizadas colunas de destilação. Nesse processo, o caldo é aquecido até virar vapor, que por sua vez é enviado a uma serpentina resfriada que devolve ao composto seu estado líquido.
5 – O coração da cachaça
Nem todo o líquido que sai do alambique é próprio para o consumo. A primeira parte do volume destilado, chamada de “cabeça”, é alcoólica demais. A última parte, chamada de “cauda”, tem pouco álcool e é composta basicamente por água. Por isso, ambas as “partes” são descartadas. A bebida é fabricada apenas com a parte do “meio” do processo de destilação, chamada de “coração da cachaça”.
6 – Envase ou envelhecimento
O “coração da cachaça” já pode ser engarrafado. A cachaça também pode ser envelhecida em barris de carvalho, amburana ou amendoim, entre outras madeiras – que podem, inclusive, alterar o sabor e coloração do produto. Depois de todo esse processo, é só saborear. Além de pura ou com gelo, açúcar e limão – a popular caipirinha –, a cachaça harmoniza muito bem com muitas frutas, como morango, maracujá e laranja.
7 – Quem inventou a bebida mais famosa?
A versão mais aceita sobre a invenção da cachaça é de que ela foi fabricada pela primeira vez entre 1516 e 1532 em algum engenho do litoral brasileiro – sendo, dessa forma, o primeiro destilado em toda a América Latina, antes mesmo da tequila mexicana ou do rum caribenho.
Alguns dizem que os responsáveis foram os primeiros portugueses que chegavam para colonizar o País, que, para amenizar a saudade da terra natal, teriam improvisado uma bebida com o que sobrava do caldo de cana. “Apesar de usar uma matéria-prima que veio da Ásia, mas se adaptou muito bem ao nosso litoral, a cachaça tem tudo a ver do Brasil”, diz Felipe Jannuzzi, criador do site “Mapa da Cachaça”, que reúne notícias, dados e curiosidades da bebida. “Seja como aperitivo ou nos drinques, como a popular caipirinha, ela ocupa uma parte muito importante da gastronomia do País. E acho que cada vez mais o brasileiro vai reconhecer e valorizar isso.”
Além de ser considerada um patrimônio cultural brasileiro, hoje a cachaça movimenta um mercado gigantesco. Segundo o Instituto Brasileiro da Cachaça (Ibrac), hoje o País conta com 40 mil produtores e cerca de quatro mil marcas da bebida no mercado internacional.
Dados Sistema de Controle da Produção de Bebidas da Receita Federal (Sicobe) mostram que, em 2013, o faturamento do setor alcançou R$ 5,95 bilhões, com a produção de pouco mais de 500 milhões de litros da aguardente. Esses números transformam a “branquinha” no destilado mais consumido no Brasil e o terceiro em todo o mundo.